terça-feira, 23 de abril de 2013

Para ti... Livro



Gosto quando te leio e folheio
e passeio nas tuas páginas coloridas,
escritas ou impressas,
soltas ou cosidas,
manuscritas,
ou navegando no digital.

Quando as tuas palavras
escorreitas e direitas
dizem as coisas claramente
e põem os pontos nos is,
sem reticências.

Ou quando deixas no ar,
com três pontos,
as tuas ideias
pra me deixar voar...

E quando puxas por mim,
e entre dois pontos,
fazes extensa enumeração ou explicitação,
e, por fim,
entre vírgulas,
a uma pausa sensata
de curta duração.

E entre aspas
me desafias
pra uma citação...

E por vezes me enleias,
em inquieto travessão,
com personagens
tão longínquas e próximas,
em falas de emoção!

E entre parênteses,
deixas apartes
e te metes entre elas, 
de permeio,
com tua interposição,
em observação...

E quando, em ponto final,
me deixas,
envolta na tua conclusão,
vivo, em repouso, 
deitado a chão
em imensa solidão...

E eu contigo, no meu coração,
mexendo em minha razão,
em interrogação, exclamação,
desassossego e inspiração...
olhando, pesando e pensando,
outros olhos, em transformação...


Imagem: "Livro..."


(Maria, 23-04-2013)


Dia Internacional do Livro, dedicado à Bibliodiversidade:
"A Bibliodiversidade pode entender-se como a oferta variada de livros. Contudo, mais do que esta definição, prosaica e redutora do fenómeno cultural a uma simples medida económica, a variedade pressupõe a multiplicidade linguística, que vai do idioma mais estranho ao dialecto quotidiano; a liberdade ideológica e a janela que oferece ao mar inquieto das verdades, que não é só uma; a possibilidade de viver o que outros sofreram e amaram, no passado, ou sofrem e amam em terras longínquas. (...) É, pois, a capacidade de elegermos entre quantos mundos nos oferecem os olhos dos outros e, com eles ou face a eles, aprendermos sobre o nosso próprio mundo.
Desde há muito se tem afirmado, uma e outra vez, que uma pessoa só se define e conhece em relação com o que não é: quanto mais pobre for a realidade que nos rodeia, mais pobres seremos nós próprios.
É por isso que a chamada à Bibliodiversidade, centrada tanto quanto possa estar num problema de produção e oferta, é, acima de tudo, um reconhecimento e uma petição para que ampliemos a nossa vida com um olhar estranho e, compreendendo os demais, nos entendamos e cresçamos...
"
 (Adaptação e tradução livre de excerto da "Comunicação de Fernando Zapata López, Director do CERLALC - Centro Regional para o Fomento do Livro na América Latina e Caribe/UNESCO", no Dia Internacional do Livro, 2013, que se comemora hoje, 23 de Abril.)

Mais info:
CERLALC - Centro Regional para el Fomento del Libro en América Latina y el Caribe
UNESCO - CERLALC-Message

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Almada... o menino


E a fé com que inventou o seu futuro...


"A flor
Pede-se a uma criança: Desenhe uma flor! Dá-se-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais ninguém.
Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direcção, outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas que o papel quase que não resistiu.
Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já era de mais.
Depois a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: uma flor!
As pessoas não acham parecidas estas linhas com as de uma flor!
Contudo, a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas são aquelas as linhas com que Deus faz uma flor!"
 




"Mãe!
Vem ouvir a minha cabeça a contar histórias ricas que ainda não viajei!
Traz tinta encarnada para escrever estas coisas! Tinta cor de sangue, sangue verdadeiro, encarnado!
Mãe! passa a tua mão pela minha cabeça!
Eu ainda não fiz viagens e a minha cabeça não se lembra senão de viagens! Eu vou viajar. Tenho sede! Eu prometo saber viajar.
Quando eu voltar é para subir os degraus da tua casa, um por um. Eu vou aprender de cor os degraus da nossa casa. Depois venho sentar-me a teu lado. Tu a coseres e eu a contar-te as minhas viagens, aquelas que eu viajei, tão parecidas com as que não viajei, escritas ambas com as mesmas palavras.
Mãe! ata as tuas mãos às minhas e dá um nó-cego muito apertado! Eu quero ser qualquer coisa da nossa casa. Como a mesa. Eu também quero ter um feitio que sirva exactamente para a nossa casa, como a mesa.
Mãe! passa a tua mão pela minha cabeça!
Quando passas a tua mão na minha cabeça é tudo tão verdade!
"
 (Almada Negreiros, A Invenção do Dia Claro, 1921)


José Sobral de Almada Negreiros, nasceu a 7 de Abril de 1893, em São Tomé e Príncipe, e faleceu em Lisboa, a 15 de Junho de 1970, com 77 anos.
Artista multifacetado, símbolo da arte moderna portuguesa, foi escritor, poeta, dramaturgo, desenhador, caricaturista-humorista, escultor, pintor.
Colega e amigo de Fernando Pessoa, e de Mário de Sá Carneiro, do grupo do Orpheu, impossível de ter continuadores pois nunca se pede bis pela abertura, como ele próprio dizia(*).

Dedicou a maior parte da sua vida à escrita. Em A Invenção do Dia Claro, de 1921, o meu único livro(*), como lhe chamou em 1953, Almada fala de um filho pródigo que parte em busca de uma vida diferente, junto do saber livresco e civilizacional, mas regressa ao ambiente materno, ciente do seu engano, apontando para a exigência da verdade.
Simultaneamente poesia, prosa e arte poética, é a obra que melhor retrata a face da recuperada ingenuidade infantil de Almada.
Escolhendo modelos que visitam a minha memória(*), O menino entre os doutores(*), como lhe chamava Fernando Pessoa, começou a pintar Na idade em que ainda nada se pinta...; Não era por alegria, foi por necessidade dela.(*)
É sua a pintura mais reconhecida do grande poeta, o retrato do seu amigo ávido do amigo(*), Fernando Pessoa.
Do artista, que do convívio social dizia: A pessoa de arte é a que convive com o maior número de gente diferente, porque não reconhece em cada um a sua classe social apenas.(*)
Almada, para quem alguma boa recordação da infância seria:
Uma. A fé com que inventei o meu futuro.(*)

Ao longo deste ano estão previstos inúmeros eventos que assinalam os 120 anos do seu nascimento.
(*) In "DIGA-NOS A VERDADE", Diário de Lisboa, p.9, Quarta-feira/28 de Janeiro de 1953, nº 10832, ano 32 (Entrevista biográfica conduzida por E.C.)

 

Mais:
Centro de Arte Moderna (CAM)/Gulbenkian: José de Almada Negreiros - Retrato de Fernando Pessoa.
Wikipedia: Diário de Lisboa

(Maria, 10-04-2013)

quarta-feira, 3 de abril de 2013

E encantamento...


Do meu Alentejo profundo
vejo a poesia e a beleza...
Mas não te digo, não,
se é terra ou maresia,
ouro ou tesouro,
achamento ou encantamento...


Ou se tudo isso...

"Queres conhecê-lo?
Vem para o meu lado
que já podes vê-lo..."




Além ao cimo,
a janela do pátio,
em castro muralhado,
por onde uma moura encantada
andou...
e um tesouro guardou
e por ele se encantou...





E antes dela habitado,
por seres iluminados...





Atlantes refugiados,
fugidos do mar...
pra aqui, terra alta,
seu lar recomeçar...
  







Aqui os jogos,
do moinho e do alquerque...

 




em pedra polida, 
que essas gentes
laboriosas e habilidosas
esculpiram, partilharam,
e em comunidade jogaram,
e outros vindouros, depois,
estratégias pensaram
e pra nós, deixaram...







E contando a história,
de Ferro, do Castro...





sepulturas xistosas escavadas,
circulares e rectangulares,
adormecidas, umas,
outras, já acordadas...






E lá ao fundo...

                                                       


 
 guardando a muralha,
o Mira espreitando
e serpenteando...
subindo e ligando,
calmo, até ao mar...




 Assim conta Al-calá, 
de seu árabe nome...
 

E em romaria,
a cada Setembro,
a Senhora da Cola.




(Maria, 02-04-2013) 
Mais info:








Povoado de Castro da Cola, Alentejo - Portugal

Neolítico até à Época Medieval:
este povoado revela vestígios de ocupação que se estendem desde a Pré-História (Neolítico - do grego neos/novo, e lithos/pedra; o período mais recente da Idade da Pedra; Pedra Polida; aprox. entre 10.000/3.000 a.C.; - ou Calcolítico - do grego khalkos/cobre, e lithos/pedra; período da Idade do Cobre; aprox.entre 2.500/1.800 a.C.) até uma época posterior à Reconquista Cristã (século XIII) altura em que terá sido abandonado.

"Classificado como Monumento Nacional desde 1910, constitui uma das mais importantes estações arqueológicas portuguesas. A sua monumentalidade chamou a atenção de diversos estudiosos desde, pelo menos, o século XVI, mas o seu estudo sistemático apenas se inicia em 1958 com uma extensa equipa de arqueólogos dos quais se destaca Abel Viana, que aí trabalhará até à sua morte, em 1964.
A fortificação principal, sobre o rio Mira, é composta por uma muralha com um perímetro aproximado de 330 metros. A entrada para esta última fazia-se através de uma grande torre, de que restam, apenas, as fundações. Daí acedia-se a um amplo pátio, que formava o centro da Al-calá (fortaleza), palavra árabe que veio a dar origem ao topónimo Cola."
(excerto de Circuito Arqueológico da Cola - Guia. Centro de Acolhimento e Interpretação Castro da Cola, Ourique - Portugal. Edição IPPAR - instituto Português do Património Arquitectónico)

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Achamento!...



Em antiga mina de ouro, no Alentejo,
cristais extraterrestres foram achados!
Até agora desconhecidos,
mas já considerados...
minerais de eras futuras
em quântica computação!
Guiados por outros tempos
e por nova geração
voados até nós,
nosso presente 
em dádiva transformação.


 
(Maria, 1-04-2013)